Como a hormona anti-mülleriana AMH protege a reserva ovárica através da estimulação da autofagia

A reserva ovárica é um componente crucial da fertilidade feminina, consistindo nos folículos primordiais (PMFs) que determinam a capacidade reprodutiva ao longo da vida. A ciência continua a descobrir novos mecanismos de proteção desta reserva. Entre estes, destaca-se o papel dahormona anti-mulleriana(AMH), não só pela sua influência no crescimento folicular, mas também pela sua capacidade de estimular um processo celular essencial: a autofagia. Este artigo explora a forma como a AMH ajuda a manter a reserva ovárica através da indução da autofagia, proporcionando assim uma melhor proteção aos folículos primordiais.

Porque é que as mulheres nascem com uma reserva ovárica limitada?

Ao contrário de outras células do corpo humano, que se renovam ao longo da vida, as mulheres nascem com um número fixo e limitado de folículos primordiais nos seus ovários. Esta reserva, estabelecida durante a vida fetal, não pode aumentar nem regenerar-se durante a vida. Em média, uma mulher nasce com um a dois milhões de folículos, mas este número diminui rapidamente a partir do nascimento, e este processo continua durante toda a sua vida reprodutiva.

Cada ciclo menstrual mobiliza uma pequena parte destes folículos, mas a grande maioria perde-se através de um processo natural chamado atresia folicular. Por conseguinte, quando a mulher atinge a menopausa, a reserva ovárica está praticamente esgotada. Por conseguinte, é essencial preservar estes folículos desde o nascimento, pois uma vez perdidos, não podem ser substituídos, afectando diretamente a fertilidade.

A preservação destes folículos primordiais é, portanto, essencial para manter a fertilidade.

Para que é utilizada a Hormona Anti-Mülleriana (AMH)?

A hormona anti-Mülleriana(AMH), produzida pelas células da granulosa dos folículos em crescimento, é reconhecida pelo seu papel inibidor na ativação dos folículos primordiais(PMFs). Actua como um regulador essencial, impedindo a ativação precoce dos PMFs e preservando assim a reserva ovárica. Esta hormona é um membro da família TGF-β (Transforming Growth Fator Beta) e exerce a sua ação principalmente através do abrandamento da via de sinalização PI3K (Phosphatidylinositol 3-kinase), que é essencial para a ativação folicular.

Porque é que a autofagia é crucial para a sobrevivência das células?

A autofagia é um mecanismo celular chave na degradação e reciclagem de componentes intracelulares danificados ou inúteis. Este processo, observado em todas as células, é particularmente ativo durante períodos de stress, como a fome ou os danos celulares. Permite que as células mantenham a sua homeostasia através da reciclagem de proteínas e organelos defeituosos. No ovário, a autofagia desempenha um papel fundamental em diferentes fases da foliculogénese, nomeadamente na sobrevivência dos PMFs.

O que é o FOXO3A?

O FOXO3A é um fator de transcrição, ou seja, uma proteína que regula a expressão de determinados genes. Desempenha um papel fundamental em vários processos celulares, como a sobrevivência das células, a resposta ao stress e, sobretudo, a regulação da autofagia, um mecanismo que permite às células limparem-se eliminando os componentes danificados. A FOXO3A é particularmente importante nos ovários, onde ajuda a proteger a reserva ovárica, mantendo os folículos primordiais em estado de repouso, preservando assim a fertilidade a longo prazo.

Estudos recentes demonstraram quea AMH ativa o processo deautofagia através da estimulação do fator de transcrição FOXO3A. Quando o FOXO3A é desfosforilado, é transportado para o núcleo da célula onde ativa a expressão de genes relacionados com a autofagia. Estes genes incluem Atg5, Becn1 e Wipi2, todos eles envolvidos na formação de autofagossomas, as estruturas responsáveis pela degradação de componentes intracelulares. Desta forma, a AMH não só impede a ativação dos folículos primordiais, como também promove a sua sobrevivência através da indução da autofagia.

Experiências in vivo e in vitro mostraram que a injeção deAMH em ratinhos induz um aumento significativo do fluxo autofágico. Por exemplo, a expressão da proteína LC3, um marcador de autofagia, aumentou nos ovários tratados com AMH, confirmando que este processo foi induzido. Além disso, foi observada uma diminuição da fosforilação de FOXO3A, sugerindo que a HAM promove a sua ativação. Estes resultados foram corroborados por análises de western blot e técnicas deimunofluorescência, mostrando um aumento na expressão de genes relacionados com a autofagia após o tratamento com AMH.

Como é que a AMH protege a reserva ovárica através de uma dupla ação?

Em resumo,a AMH desempenha um papel fundamental na proteção da reserva ovárica. Não só inibe a ativação prematura dos folículos primordiais, como também estimula o processo deautofagia, garantindo assim a sobrevivência destes folículos. Estas descobertas abrem novas perspectivas terapêuticas para as perturbações da fertilidade, nomeadamente no que respeita à preservação da fertilidade nas mulheres que sofrem de menopausa prematura ou defalência ovárica prematura.

Este papel protetor da AMH, através da indução da autofagia, sublinha a importância desta hormona na gestão das reservas ováricas e abre novas perspectivas para a medicina reprodutiva.

Fontes

  1. A hormona anti-Mülleriana induz a autofagia para preservar a reserva de folículos primordiais em ratinhos, 2024
  2. Hormona anti-Mülleriana na reprodução feminina. Endocr Rev. 2021
  3. Al-Bari MAA, Xu P. Regulação molecular da maquinaria de autofagia por vias dependentes e independentes de mTOR. Ann N Y Acad Sci. 2020

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